Entrevista presidente da CLDF Wasny de Roure

Tiago Monteiro Tavares
Técnico da Conab, onde iniciou sua trajetória política como presidente da associação de servidores, Wasny de Roure é mestre em economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade de Oxford, Inglaterra. Foi diretor do Sindsep e diretor do Dieese-DF. Eleito deputado distrital pela primeira vez em 1990, na primeira legislatura do DF, relatou as emendas populares à Lei Orgânica e foi secretário de Fazenda no governo Cristovam. De 2000 a 2001, presidiu o Partido dos Trabalhadores no DF (PT-DF), cumprindo seu terceiro mandato parlamentar na capital federal. Em 2003, assumiu o mandato de deputado federal. Na eleição seguinte, ficou como suplente e, em 2010, foi eleito pela quarta vez como distrital, sendo líder do governo em 2011/12 e elegendo-se presidente da CLDF para o biênio 2013/2014.
Foto: Roberval Eduão
O senhor é servidor público da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Quando tomou a decisão de se candidatar?

Quando cheguei à Companhia de Financiamento da Produção (CFP), comecei a me envolver com a Associação dos Servidores, da qual, pouco depois, tornei-me presidente. Nessa época, fizemos um movimento de aproximação com as associações de servidores do complexo da Agricultura, Embrapa, Sebrasem, Cobal e CFP. Simultaneamente a isso, outro movimento criou o Sindicato dos Servidores Públicos do DF, à época, capitaneado pela então deputada federal Maria Laura, que procurava as empresas públicas regidas pela CLT e os trabalhadores da administração pública federal. Eu vinha de um período de treinamento fora do país e estava alcançando quase o topo da carreira dos servidores do órgão. Passei a me envolver cada vez mais no trabalho de militância e, naquele período, havia várias denúncias de irregularidades no interior do CFP, tanto na área dos transportes quanto na armazenagem. A imprensa fez uma grande cobertura e, a partir de então, entendemos que não poderíamos nos calar.

Os parlamentares da primeira legislatura da CLDF costumam pontuar o quanto eram diferentes a representação e o envolvimento da Casa. Como integrante dessa legislatura, o senhor vê contraste na atuação dos parlamentares hoje? Quais seriam?

É verdade. Quando a Câmara começou, havia um debate político reprimido na cidade, que era a busca por sua identidade. E o primeiro grande debate foi em torno da Lei Orgânica (LODF), que adentrou em algumas discussões pioneiras no Brasil, que ainda eram tratadas de forma muito superficial, como nas áreas de ciência e tecnologia, orientação educacional, sendo a terra o grande motivo de polêmica. Também houve muita participação popular, as pessoas tinham vontade de participar, assim como a organização dos movimentos sociais também se estruturava. Lembro-me que eram 17 emendas populares à LODF, que precisavam de uma designação para serem defendidas na Câmara. Eu fui designado para representar 16 dessas emendas, o que, para mim, foi um enorme privilégio e orgulho, pois tinha sido naquela ocasião o deputado menos votado, fato que logo deixou de ser um incômodo e, com isso, fui aumentando minha participação. Eram outros tempos, a questão da participação era mais intensa.

Após três mandatos como deputado distrital, um como federal e uma experiência na Secretaria de Fazenda do DF, o que o trouxe à CLDF pela 4ª vez?

Após o meu mandato de deputado federal, fiquei como suplente na eleição subsequente, apesar de ter recebido 53 mil votos. Passei a me dedicar ao meu serviço na Conab e às questões pessoais. A primeira legislatura foi uma grande experiência e um intenso preparo na estruturação do PT-DF e a organização da candidatura do partido, por meio do professor Cristovam Buarque, ao Governo do Distrito Federal. O PT ainda não tinha acúmulo institucional, mas tinha a maior representação no parlamento. Na história da CLDF, o PT sempre teve a maioria das cadeiras. É importante que seja ressaltada a questão da fidelidade partidária, pois faz parte da história política do DF e, principalmente, do PT. Há críticas, mas havia e há um desejo de se formar uma visão de gestão da cidade.
Depois, tivemos um corte para que o partido se envolvesse na candidatura de Lula à Presidência. Tudo isso de maneira muito intensa. O Cristovam eleito trouxe inovações de gestão de políticas públicas. Naquele momento, tivemos uma celeridade nos processos de assentamento na cidade. O PT se posicionou questionando o aspecto clientelista e fisiológico desses assentamentos sem que houvesse uma política pública para tanto. Querendo ou não, Brasília construiu um capítulo que, ao longo do tempo, vai gerando problemas, como a proliferação de cidades inteiras oriundas de doações de terras. Tivemos pouca transparência em todo esse processo. Essa é uma questão que ainda precisamos aprofundar, pois, seguido a isso, tivemos a sociedade se organizando e começaram os condomínios, ou seja, a política urbana em Brasília sempre foi muito intensa e polêmica. Essa questão sempre me motivou a seguir contribuindo. 

Quando presidente do PT-DF, o senhor liderou o Movimento pelo Resgate de Brasília. Como se deu essa questão e qual era seu objetivo?

Essa é uma experiência traumática. Aquela eleição foi uma disputa minha contra a atual deputada Arlete Sampaio, na qual a diferença dos votos foi mínima e não conseguimos fazer a recontagem. A solução foi dividir o mandato entre nós dois. De qualquer forma, foi um aprendizado, a cidade vivia uma efervescência muito grande que, de certa forma, continua. Brasília tem uma relação diferente com o Estado e a coisa pública. Nós enfrentamos muitos escândalos e, já naquela época, havia a preocupação da contaminação do Estado pela má gestão dos políticos, muito parecido com o que se tem hoje. A corrupção não é apenas algo que estabelece pelos fatos, mas pela cultura da leniência, contrária à cultura do bem à coisa pública. Temos um dever não só com o contracheque, mas com o público. Fizemos então o movimento, já preocupados em mudar a visão e a cultura quanto à representação política.

A Casa está com problema para reunir quórum e dar respostas rápidas a projetos em tramitação. Como o senhor analisa isso? Há solução?

A Câmara tem um exercício bem dinâmico. A atividade política depende muito do trato com o interesse público na Casa e isso está ligado à forma como cada deputado trata essa questão. Atrás disso, temos a relação com que cada um dos parlamentares tem com o Executivo e, aí, temos de entender tanto o papel da oposição quanto da posição dos que formam a base de governo. É uma relação complexa onde há interferência de diversos fatores.
O parlamentar tem uma atividade permanente na sociedade, tendo demandas enormes, onde algumas procedem, outras, não. O deputado, naturalmente, tentará viabilizar as que ele tem e, geralmente, somos criteriosos para escolhê-las. Elas são tratadas junto ao Executivo ou em outras esferas adequadas. Entendo que há muitas deficiências no trato do Executivo com a Câmara Legislativa. Temos um excelente quadro da Casa, que dialoga sobre as tratativas de projetos, emendas e convergência de interesses, sanções e vetos. As demais, que devem ser tratadas junto ao governo, ficam a cargo de José Willeman, servidor do primeiro concurso da CLDF. Porém, nem sempre a política se limita a isso. O governador acaba concentrando nele essa interlocução e, naturalmente, para quem tem uma agenda de governador do terceiro maior conglomerado urbano do país, é preciso entender que há fortes limitações para atender a magnitude de pleitos que os parlamentares têm e a necessidade de diálogo com o governador.
Atualmente, estamos tentando construir um canal de comunicação com a vice-governadoria e espero que dê certo. Seriam demandas como asfaltamento, infraestrutura e questões mais fáceis de serem resolvidas. Isso porque apresentamos centenas de indicações que acabam não tendo nenhuma resposta. Seria o jeito de resolver esse impasse.

Quais são os avanços e as deficiências da Câmara Legislativa neste momento?

Avalio que a Câmara tem avançado. Alguns não reconhecem isso e eu respeito, agora, acredito que a Casa tem dado o tratamento, inclusive nas questões mais constrangedoras, como o corte na própria carne, com as cassações. Poucas casas fazem com a altivez que a CLDF tem feito. A decisão pelo voto aberto é um exemplo. Antes mesmo do Congresso Nacional, antecipamo-nos para dar uma resposta à sociedade. Trabalho do nosso colega Chico Leite (PT).
Creio que a Casa precisa fazer uma avaliação em um momento adequado, mas este não é o momento sobre o nosso normativo, que trata da ética e do decoro parlamentar. Para tanto, é necessário um envolvimento de todos os parlamentares e não podemos fazer isso quando alguns estão passando por esse problema.
Quanto ao avanço das nossas atividades de interface com a sociedade, seja no aspecto social ou cultural, temos tido bom resultado. Esta semana, lançaremos o Programa História da Cidade, que relata a criação dos conglomerados urbanos, além da realização dos encontros musicais, aos domingos.
Consegui introduzir a abertura das emendas, relatórios e pareceres no site da Câmara, para agregar mais transparência ao processo e facilitar a vida da população. Assinamos também um convênio com a Gráfica do Senado, faltando apenas a assinatura do presidente Renan Calheiros (PMDB) para recebermos publicações e fazermos divulgações de leis e matérias aprovadas pela CLDF, que passariam a ser impressas pelo Senado.
Queremos avançar nas tratativas com os vereadores da Região Integrada de Desenvolvimento do Entorno do DF (Ride) para formarmos uma agenda comum que traga benefícios diretos para o DF e para os municípios. Estamos implementando, nesta semana, o serviço de Wi-Fi no interior da Casa, para melhorar a comunicação e facilitar a vida dos visitantes. Fizemos uma licitação para manutenção da nossa sede, mas tivemos problemas e teremos que fazer a anulação da mesma. Fizemos a licitação, que está em fase de implantação, da recepção de estagiários na Casa. Revitalizamos os jardins, em parceria com a Novacap, e faremos algumas correções como a questão do trato do salário dos servidores do Tribunal de Contas e também dos servidores da segurança aqui da Casa.
Acabamos com a gráfica nos moldes antigos, reajustando os servidores para trabalhar em um caráter digital. Precisamos avançar em outras áreas que carecem de um aprimoramento. Reuni-me com os servidores do protocolo, onde precisamos melhorar. Sem falar que temos sérios problemas de deficiência de pessoal, mas já estamos preparando o próximo concurso da CLDF, a ser realizado no próximo ano.

O momento político está voltado para dois projetos muito relevantes: a LUOS e o PPCUB, cercado de polêmicas. O que podemos esperar sobre esses assuntos em curto prazo?

O PPCUB tem características da mesma natureza da LUOS, mas bastante distintas. Temos hoje, em Brasília, um segmento bem ativo da sociedade, tanto na sociedade civil quanto nas entidades representativas, de cuidado com a cidade. Isso é muito importante. Outro fator relevante é a necessidade de preservarmos nossos órgãos de controle como o Ministério Público, o Iphan e o Ibram. Temos de saber ouvi-los. Concordar ou discordar faz parte do processo, mas precisamos ter em mente o interesse público. Neste caso, o Governo já fez algumas reconsiderações ao texto encaminhado que, a meu ver, já são bastante significativas, mas ainda não foram convertidas através de emendas ao texto apresentado. Há, aproximadamente, uns dez grandes temas que o governo está repensando. Também tem outras questões que carecem de aprofundamento. Para isso, exige-se diálogo, tempo e conhecimento “in loco” do problema por parte dos parlamentares. Então, não podemos votar açodadamente, apenas para dizer votamos, mas votamos o quê? É necessário mais tempo para não haver contestações. Há um ponto principal nessa questão: enquanto não houver o equacionamento do entendimento do Ministério Público, não temos o que fazer. Por ausência das representações populares da sociedade civil, o órgão entende que o projeto não foi devidamente tratado no Conplan e suspendeu o processo. Temos de esperar. Política se faz com autocrítica e, neste momento, precisamos resolver isso. 

Neste mandato, qual foi sua maior conquista e o que o senhor ainda gostaria de fazer até o final da legislatura?

Minha maior conquista é ter aprovado a lei que assegura maiores recursos para a área de pesquisa e extensão, 2% da receita corrente líquida, o que hoje representa R$ 600 milhões. Se pensarmos que a Fapesp, de São Paulo, trabalha com recursos de R$ 1 bilhão, estamos equiparados, proporcionalmente. Há uma arguição de inconstitucionalidade que estamos fazendo um trabalho de convencimento do Ministério Público. Desde o início, tinha assumido a responsabilidade de cobrar a retomada do debate do ensino superior patrocinado pelo Governo do DF, algo que vem acontecendo timidamente. Outro projeto é a destinação de 3% da área de educação para o ensino superior. Além desses, destaco a política de creches. São três áreas fundamentais e que tenho conseguido ajudar. O calendário atrasou, mas estamos começando a avançar nessa questão. Os editais para cooperação do governo com entidades que trabalham com crianças agilizarão o atendimento dessas áreas. Não estou satisfeito com o que já alcancei, quero continuar ajudando a fortalecer essas áreas.
Creio que a Câmara tenha uma dívida gigantesca com a sociedade, que é a criação da TV Legislativa, e estou focado nisso. Depois da normatização e efetivação dos trabalhos internos e transposta a barreira da verba de publicidade, passei a focar na TV. Espero muito em breve dar uma resposta concreta à nossa sociedade. Aproveito a oportunidade para pedir desculpas à população pelo atraso, mas é uma licitação bem complicada.

Quais as pretensões do senhor para as eleições de 2014? E quanto ao sonho de ser Conselheiro do Tribunal de Contas do DF?

Não tenho perspectivas quanto à abertura da vaga para o TCDF. Atualmente, o processo está suspenso pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e não há uma previsão para que isso ocorra. Portanto, estou focado no processo eleitoral de 2014 e trabalho para viabilizar minha candidatura à reeleição. Acredito que, com cinco mandatos, já é tempo de entender que estamos em um processo de expectativa por novos nomes, mesmo sabendo que a experiência tem seu valor e não pode ser vista como algo permanente.
Sou, sim, candidato e apoiarei a candidatura do governador Agnelo Queiroz (PT). Contudo, é fundamental que façamos uma leitura crítica e possamos corrigir as falhas. Acredito que o governo Agnelo tem alguns resultados que resgatam Brasília. O primeiro é o novo projeto do Transporte Público. Em segundo lugar, a reestruturação das empresas públicas, que estavam em processo de falência, como a CEB, a Caesb, o Metrô, a Emater e outras. Por fim, a retomada do sistema de recuperação da Saúde, que ainda não é satisfatório, está longe disso, mas é nítida a melhora do sistema como um todo. A Saúde é deficitária no país todo, não é fácil conseguir resolver. A grande dívida fica por conta do setor da segurança pública, que ainda está muito deficitária e o governo ainda precisa dar essa satisfação à sociedade
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